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]]>Coluna. Na cozinha simples, com chão de cimento batido, jamais faltaram mesa farta, açúcar e afeto.
Na casa sempre cheia de filhos e netos a comida não saia da mesa. Café da manhã emendava com almoço, que dava lugar ao lanche da tarde e em seguida vinham jantar e ceia. Dinheiro era contado, mas vovó Eny tinha o dom de fazer a comida render em receitas que só se via na cozinha dela. Angu recheado com carne moída e queijo, por exemplo, eu nunca mais experimentei depois que ela se foi.
A vida era tão doce por lá. Açúcar tinha aos montes. O café até podia ser ralo, mas a doçura chegava a colar na boca. Quando fecho os olhos, parece que ainda escuto ela repetindo: “às vezes, eu acho açúcar sem doce, minha neta”. Era com doses generosas de açúcar que ela preparava minha lembrança mais saborosa: o rocambole de doce de leite.
Todo 23 de junho, mal os olhos se abriam, o telefone já tocava: “vem buscar seu rocambole, minha neta”. Era assim que vovó me presenteava em todos os aniversários. Não era privilégio de neta afilhada, não. O presente era o mesmo pra todos os netos e filhos. Um ritual.
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Vovó Eny sempre gostou de presentear. Tinha uma bolsinha escondida no fundo do armário onde juntava todo dinheiro que conseguia. Mas acho que ela nunca encontrava notas à altura do afeto que carregava no peito. Um dia, deixou de comprar lembrancinhas e passou a fazer o que ela mais sabia: adoçar a vida.
Não falhava um aniversário. O rocambole vinha enrolado num plástico transparente e derretia na boca, de tão macio. A gente se lambuzava naquela massa coberta de açúcar e recheada com doce de leite. Certamente ganhei outros presentes de vovó Eny, mas a memória se fez no ritual açucarado.
Vovó achava aquilo simples demais e sempre reclamava que queria ter condições de comprar um presente “melhor”. Mal sabia ela que os sabores daquela cozinha valiam tão mais.
A quarentena me levou pra cozinha de um jeito que nunca havia estado antes. Do café da manhã ao jantar. Cansa? Sim. Eu reclamo? Muito mais do que deveria. Mas, numa dessas tardes frias de outono, me percebi repetindo gestos de vovó Eny com pequenos rituais culinários.
Ando descobrindo que cozinha é espaço de memórias, afetos e sabedoria. No fundo, a vida é como um livro de receitas. Existe o tempo pra cada passo, não se apressa o cozimento, um descuido pode fazer tudo desandar, a delícia está no equilíbrio dos temperos, embora um punhado a mais de açúcar não faça mal a ninguém. Vovó Eny soube temperar as relações com uma doçura que era só dela.
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]]>Coluna Amor de Mãe. Medo de deixar quem eu amo, medo de perder quem faz parte do meu caminho, medo de não saber o que fazer com as horas que repentinamente deixaram de ser tão cheias.
Encontrei sossego no ano de 2007. O ano que me transformou, que me mostrou o meu avesso. O ano em que fui mãe de quadrigêmeos. A gravidez de risco me levou pra cama logo nos primeiros meses de gestação. Peguei uma mala com poucas roupas e me mudei pra casa da minha mãe. Naquele momento, precisava de aconchego e cuidado. Busquei o colo que nunca falta.
Fiquei longos quatro meses sem sair da cama. Meu corpo precisava repousar pra que meus filhos pudessem sobreviver. Minha existência deixou de ser foco e eu passei a ser apenas um instrumento pra levar comida e oxigênio pra outras vidas. Tudo que dizia respeito a mim mesma ficou num canto qualquer: trabalho, vaidade, projetos, vida social… Ressignifiquei o meu olhar pra encontrar outros sentidos.
Fácil não foi. Eu dependia de ajuda pra tudo. Pra alimentar, pra tomar banho, pra fazer xixi numa comadre. Logo eu, que sempre fui tão independente! Sim. Logo eu.
O que me fez parar de forma tão avassaladora? A vida. As quatro vidas que eu gerava dentro de mim eram maiores do que qualquer ego, qualquer egoísmo! Eu aceitei e fui muito feliz naqueles meses em que o tempo correu de um jeito tão diferente.
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Em 27 de dezembro de 2007, eles nasceram: Vitor, Joaquim, Enzo e Francisco. Em um mês, enterrei dois filhos. Eu havia parado minha vida pela deles, mas não foi suficiente. Eles tinham que ter ficado mais tempo dentro de mim pra amadurecer os pulmões. Nasceram pequenos demais. Foram gigantes na luta pela vida, mas partiram deixando em mim um vazio que nunca foi preenchido. Nem será.
Doze anos depois, vejo, de novo, a existência se recolhendo dentro de casa. Mais uma vez, eu precisei parar pela vida. Não mais pela vida dos meus filhos, apenas. Mas pela vida de quem talvez eu nem conheça. Por tantas vidas que não sei nem as histórias. De repente, outra vez, tenho que me colocar em segundo plano, pelo outro.
Quando compreendi, acalmei o desassossego. Claro que tudo isso é percebido de lugares diferentes, por ângulos diferentes. Estamos impregnados pela nossa história, pela nossa condição social, influenciados pelos nossos orçamentos, pela nossa rotina, pela nossa religião e, sobretudo, pelos nossos princípios. As lições são também individuais. Mas, nesse momento, o soberano está fora de nós. É pelo outro. É por todos. É pra além de nós. Que a compreensão se faça em todos os corações.
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]]>Coluna. Quando a maternidade nasceu em mim conheci o meu avesso. Foi assim, desde quando meus filhos estavam na barriga. Nada foi convencional. Nada foi fácil. Meu despertar como mãe passou longe dos comerciais de margarina. Entendi rápido: conto de fadas não é pra mim. E tá tudo bem. Na verdade, tá tudo ótimo porque a vida é muito mais interessante longe da pretensa perfeição.
Quando descobri meu avesso, supreendentemente, vi o belo. É no avesso que a verdade se mostra sem filtros e a gente se percebe com mais generosidade. Assim, fui me permitindo errar sem aquela culpa assustadora que parimos com os filhos. Calma, não sou mãe sem culpa. Longe disso. Mas sigo me permitindo experimentar a liberdade que vem do perdão.
Só que mãe é bicho danado e mesmo que a gente se deite uma vida inteira no divã vai acontecer o ‘momento deslumbre’. É aquele instante em que os olhos do seu filho transbordam tanto amor e admiração que você acredita: opa, tá dando certo!
Essa ilusão costuma durar até o dia em que nossos filhos são possuídos pelos hormônios da adolescência. Aquele momento lindo do desabrochar, relatado com tanta poesia nos livros, mas que dentro das paredes da sua casa pode ser descrito como surto coletivo.
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No meu caso, o primeiro susto veio quando vi meu filho trocando de roupa. Era hora de dormir e quando entrei no quarto ele estava colocando o pijama. A rotina de sempre. Só que não me preparei pra ver aquele corpo transformado. Tentando sair do estado de choque, perguntei: já escovou os dentinhos, filho? Sim, eu falei dentinhos … e num instante aquele olhar que até pouco tempo transbordava amor passou a me fuzilar. Saí da condição de heroína pra mãe “sem noção” … e era só o início.
Daquela noite em diante nunca mais fui a mesma. Pelo menos não pelos olhos do meu filho. Ainda bem que fiz muitos anos de psicanálise e minha autoestima tá ok porque, gente, ter filho adolescente é ser desmistificada a cada segundo. A real é: nada do que você fala tem mais importância, nunca seremos descoladas aos olhos deles, não adiante pagar de moderna, tentar entrar no mundo da geração Y, Z, nem de qualquer outra letra do alfabeto. Esquece. A matemática é: o desabrochar do seu filho será igual ou maior a … fim de encantamento.
Passei a me lembrar das apresentações da escola cheia de nostalgia. Meus filhos subiam ao palco e eu já esperava pelos olhinhos deles me procurando na plateia. Nossos olhares se encontravam, eles suspiravam aliviados e sorriam. Daí pra frente os ombrinhos se erguiam e eles se enchiam de coragem. Deu uma baita saudade de ser alicerce.
Revisitei meu avesso e a tristeza foi inevitável. A gente nunca tá preparada pra ver os filhos querendo se libertar de nós. Mas sigo tentando compreender que o desabrochar exige rompimento. Não há como se descobrir sem desfazer as amarras invisíveis do cordão umbilical. O despertar também acontece pela desconstrução. Também quero ver desabrochar em mim uma nova maternidade, quero renascer mais verdadeira e construir com meus filhos uma relação em que as diferenças estejam à mostra. Afinal, amor nunca careceu de perfeição.
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]]>Amor de mãe. Lá em casa, dia de jogo sempre foi dia de festa
Eu, confesso, nunca entendi nada (mas nada mesmo) de futebol, mas adorava domingo de clássico e o som do interfone que a todo instante anunciava: vai ter junta-junta. Vovô era sempre o primeiro a chegar e o único que não fazia barulho. O resto da parentada de descendência italiana mal passava pela porta e já começava a bagunça. Somos uma família barulhenta. Gente que fala alto, gargalha, gesticula como se tivesse brigando. Na hora de xingar juiz então, meu Deus, minha torcida ia para os anjos tamparem os ouvidos.
Cresci assim. Com a casa se transformando em arquibancada em dias de futebol. No intervalo, todo mundo ia para a mesa enorme saborear o café medroso, como costumava dizer seu Possato. “Café medroso, vô?” Um dia perguntei. “É café que vem acompanhado, minha neta.” Eu olhei para mesa farta e entendi: broa, pão de queijo, queijo, pão, rosca, biscoito e etc. Cada um trazia o que tinha em casa e o café rapidinho ficava medroso.
Em Minas, a rivalidade é entre Cruzeiro e Atlético. Quando tinha jogo, minha casa sempre ficava mais azul. Sim, minha família é quase toda cruzeirense. “O maior dos gramados”, cresci ouvindo meu pai dizer. Mesmo sem compreender a dinâmica da bola, acabei me vestindo de azul também: “o manto sagrado”.
Os anos se passaram, sai de casa, me casei e tive dois filhos. Dois homens, que não demoraram muito a ganhar o uniforme de cinco estrelas. Enzo e Francisco mal sabiam falar e o avô já se punha à postos para ensinar as sílabas mais importantes do dicionário: zê-ro! Eu achava graça, mas alertava: “pai, eles podem escolher o time que quiserem.” Ele torcia o nariz, sem jamais considerar a hipótese de ter os primeiros netos homens torcendo para o time rival.
Por que é tão difícil deixar quem a gente ama escolher os próprios caminhos? Carregamos uma certa arrogância ao acreditar que sabemos o que é melhor para o outro. Mesmo com boa intenção, muitas vezes sufocamos escolhas que jamais deveriam ser nossas. Projetamos, no outro, desejos, sonhos, projetos, até time de futebol. Nos sentimos no direito de assumir a direção de um roteiro que não é nosso.
Meus filhos? São cruzeirenses, para o orgulho do avô. Para o orgulho de mãe basta que sejam capazes de fazer as próprias escolhas. Eles são os donos da bola e podem tocá-la para o lado que quiserem. Fico na arquibancada torcendo para que o lado seja sempre o da verdade, do respeito, da empatia, do amor. Se a bola desviar demais vou gritar, claro. Sou sócia-torcedora. Vou comemorar vitórias, chorar derrotas. Mas não posso entrar em campo. Esse jogo não é meu. Serei torcida, juíza, bandeirinha, treinadora, mas só chuta para o gol quem está nos gramados.
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]]>Amor de Mãe. Tenho filhos gêmeos, com personalidades opostas e tempos distintos
Francisco já desabrochou. Tem andado suspirando pelos cantos. Vive com os olhos grudados no celular e pensamento vagando sabe se Deus por onde. Enzo fincou o pé na infância.
Dia desses, num café da manhã de sábado, a prosa foi fluindo sem pressa e descambou pras coisas do coração. “Filho, você já tá olhando meio diferente pra alguém da sua escola?”. “Não, mamãe.
Eu não gosto de ninguém, se é isso que você quer saber”. Enzo sempre foi perspicaz. Retruquei dizendo que um dia ele vai gostar de uma pessoa e já fui logo adiantando que eu gostaria de saber quando isso acontecesse. Foi quando ouvi a resposta que me paralisou durante alguns minutos: “Tá bem, mamãe. Mas por enquanto, acho bem desnecessário gostar de alguém”.
Não parei mais de pensar sobre o amor desnecessário. Num primeiro momento, analisei: nossa, o livro que li sobre como educar um filho com autoestima funcionou. Esse menino se ama tanto que se basta. Palmas para mim e para ele. Ufa, posso passar pro próximo capítulo.
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Depois, fiquei imaginando os amores desnecessários que já vivi. Tantos! Teria evitado muito desassossego se aos 20 anos de idade tivesse a sabedoria do meu filho de 11. Não teria acreditado em juras sem lastro, meus olhos não teriam brilhado com palavras desconectadas do coração, amores rasos jamais teriam feito moradas tão profundas em mim. Senti aquela vontade sorrateira de voltar no tempo e suspirei apaixonada pelos amores desnecessários.
O café já tinha até esfriado quando eu fitei os olhos do meu filho e disse sem pestanejar: o amor nunca é desnecessário, meu pequeno. É na entrega que a gente se fortalece. É o amor que nos torna melhor, sempre. Ainda que o outro não esteja preparado para receber o que oferecemos com tanta verdade.
Enzo, um dia o compasso do seu coração será diferente e você vai entender que amor chegou. Permita que ele se instale. A vida só faz sentido assim. Entregue o que tem de mais bonito, a gente nunca perde amando. Haverá dores, desilusões, incompreensões. Amar machuca. Mas eu te asseguro que de todas as necessidades da vida, essa é a mais bonita. É pelo caminho do amor que nossas verdades ganham raízes e se aprofundam em valores que devemos reverenciar.
Quando doer, aprenda com as dores. As decepções nos fortalecem. E nunca se esqueça: a vida tem mais poesia com os amores, os necessários e os desnecessários.
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]]>Amor de Mãe. Estava pensando na primavera que se aproxima e nos meus filhos que andam querendo florescer
Outro dia, levei um susto danado ao correr os olhos nas trocas de mensagens do Francisco com os colegas da escola. Sim, sou do tipo que faz blitz no celular e me recuso a discutir direito à liberdade com uma criança de 11 anos. Sou mãe, tenho autoridade e faço uso dela quando se faz necessário. Voltando à troca de mensagens, confesso que perdi a respiração. Li, reli, li outra vez e me perguntei perplexa: cadê meu filho?
Da tela saltavam palavras e expressões que nunca ouvi da boca dele, percebi comportamentos que jamais havia enxergado, descobri um desconhecido habitando o corpo do meu filho. Desliguei o celular e fui dormir chorando de soluçar. Naquele instante o destino me parecia inevitável: a criança doce se transformaria num adolescente rebelde sem causa. Tive pesadelos escabrosos.
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Acordei com olhos inchados de chorar, mas cumpri o ritual da manhã. Fiz café, esquentei o pão, me lembrei de pegar o lanche que eles sempre deixam para trás e seguimos para a escola. Em silêncio. Fiquei muda por mais de uma semana. Não briguei, não conversei, mas, internamente, processei. Comecei me perguntando o que exatamente havia de tão absurdo nas mensagens e a resposta foi simples: nada. Havia apenas um filho que não é mais um bebê. Havia apenas um filho sendo pré-adolescente. Havia apenas um filho se descobrindo crescido. Havia simplesmente uma mãe despreparada pra ver o filho florescer.
Logo eu? Eu que sempre fui tão atenta. Eu que acompanho cada passo. Eu que sou tão sensível aos olhares, aos sentimentos. Logo eu? Sim. Logo eu. Uma mãe como qualquer outra que se recusa a tirar os filhos do colo. Uma mãe como tantas que não sabe deixar os filhos darem os próprios passos. Uma mãe igual a muitas que sofre ao pensar que um dia vai ter que deixar os filhos irem.
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Desculpa, filho. Eu não me preparei para isso. Não me preparei para sua primavera. Não achei que seu florescer chegaria tão rápido. E doeu em mim te perceber indivíduo. Não há nada de errado nas suas conversas. Não há nada demais no seu comportamento. Tudo segue conforme o ciclo da vida (e dos hormônios).
Escrevo enquanto ainda tento entender os sentimentos e acalmar meu avesso. Prometo tentar permitir que você voe a rota que planejar. Deleite-se com o frescor da vida que floresce. Descubra-se. Meus braços serão abrigo toda vez que a vida se fizer dura demais. Meu colo é seu. Meus conselhos e meu silêncio também. Serei guia, serei amparo, serei torcida, serei correção, mas jamais serei obstáculo. Plante seu próprio jardim. Criamos boas raízes, agora floresça.
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]]>Amor de Mãe. Meus filhos nasceram bem antes da hora
Saíram de mim direto pra uma incubadora de CTI, onde maturaram durante longos e difíceis meses. Eram quatro bebês, dois não sobreviveram. Num desses dias de muita dor, ganhei de uma amiga querida um presente especial. Patrícia guardava com devoção um terço que herdou da vó Mariquinha, que partiu deixando saudade e muita sabedoria. Sempre que a vida apertava, Pati segurava o terço na certeza de que encontraria amparo e luz. E encontrava.
Eu sempre soube do amor devoto de Patrícia com a avó, o que tornou o presente ainda mais simbólico. Apeguei-me a ele muitas e muitas vezes, com a mesma devoção. Meus filhos cresceram, deixaram o CTI, e, aos poucos, a vida foi retomando seu curso. Os tempos sombrios do hospital foram ocupando um lugar na memória, sem grandes repercussões na rotina.
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Passados sete anos, Patrícia viveu uma dor muito doída. Daquelas difíceis de amparar. Meu coração ficava pequeno pensando no sofrimento dela. Aí, um dia, fui até a caixinha de lembranças dos meus bebês, que a essa altura não eram mais tão bebês assim, e reencontrei o terço da vovó. Fiz uma oração de gratidão e entreguei a Patrícia dizendo: o terço é seu. Ele precisava voltar pra você. Nos abraçamos fortemente.
Isso tem cinco anos. Patrícia agora mora em Brasília, onde o terço se fez necessário de novo. Desta vez, pra socorrer a mãe aflita de um amigo que partiu cedo demais. Pati me contou a história pelo computador. De lá, ela teclava e chorava. De cá, as lágrimas também escorriam. O terço acolheu a mãe do amigo por um tempo e depois, de forma quase mágica, foi devolvido mais uma vez à dona.
Fiquei pensando na corrente do bem que muitas vezes vivenciamos sem nem perceber. Quando ganhei o terço da Pati fiquei muito tocada pelo desprendimento que ela teve. Eu que sou tão apegada às minhas memórias não me imagino capaz de um gesto assim. E como doar é transformador! Não doar objetos que não nos servem mais. Isso é fácil. Raro é doar palavras certas, olhares verdadeiros, abraços acolhedores, afagos despretensiosos, colo silencioso.
O terço da vó Mariquinha está de volta às mãos da dona, mas tenho certeza que, no tempo certo, acalmará outros corações. Parece ter sido predestinado a isso. E não estamos falando de fé. Estamos falando de dar sem esperar em troca. Estamos falando de querer bem, de estender as mãos, de ter empatia, de oferecer o que temos de sagrado. Custa? Sim. Custa amor. Obrigada, Pati, por tanto!
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]]>Amor de mãe. Meus filhos têm 11 anos e eis que decidiram participar de um projeto de voluntariado na escola
Todas as sextas-feiras trocam o videogame pelo bingo com idosos do asilo. Passam a tarde lá ajudando com os lanches, cantando e conferindo as cartelas de jogo. Achei que o entusiasmo duraria pouco, mas a alegria deles se consolida a cada semana. Enzo e Francisco chegam em casa cheios de história.
Sei que na casa de repouso tem a dona Maria José, uma senhorinha falante que adora contar sobre a infância no interior de Minas. Lá também mora o seu Joaquim, que detesta que mexam na cartela de bingo dele. “É um pouco rabugento, mamãe, mas é legal.” Ah, tem também o seu Normando, que pede abraço pra todo mundo.
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Um dia perguntei por que eles gostam tanto de ir lá. “Eles precisam de ajuda, mamãe, e ficam felizes quando a gente chega cantando pra eles.” Abracei meus filhos cheia de gratidão. Que bom ver nossas sementes brotando. Como é bonito ver nossos filhos escolhendo bons caminhos pra trilhar. De alguma forma, acho que tenho conseguido ensiná-los a olhar pro lado e perceber o outro.
A empatia vem do coração, mas é também um exercício diário. Uma construção que compete aos pais. Desde que meus gêmeos eram pequenininhos eu pedia ajuda com as sacolas do supermercado. Pegava as mais levinhas e distribuía entre os dois. Eles saiam desengonçados, fazendo graça com as compras. Quando cresceram, a brincadeira de infância virou gesto natural. É mais do que uma gentileza. Eles entenderam que ajudar é obrigação.
Não, não tenho dois anjinhos em casa que acordam dispostos a arrumar as próprias camas e lavar as xícaras do café da manhã. Tenho filhos comuns, que deixam toalha no chão, roupas espalhadas pelo banheiro e material escolar desarrumado. Mas eles se tornam especiais quando percebem que não são desconectados de outras histórias. A maturidade vai se encarregar de colocar as bagunças da infância no lugar, mas já me sinto privilegiada por testemunhar a empatia.
Eu quero que meus filhos cresçam com os olhos conectados ao coração. Só assim eles serão capazes de enxergar que somos uma grande teia, com vidas que se cruzam e se entrelaçam. E o enlace é mais verdadeiro quando nosso coração consegue enxergar o outro.
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]]>O post Escola da vida e os ensinamentos que ela nos traz apareceu primeiro em Jornal da Cidade BH.
]]>Amor de mãe. Nunca combinei com números. A soma mais simples é complexa demais pro meu raciocínio lógico
Aliás, chego a duvidar se tenho um raciocínio lógico. Desde pequena, encontro meu encanto nas palavras. Elas sim me fazem brilhar os olhos. Nelas, vejo poesia; com elas, me transporto pra onde eu quero; são elas que me conduzem pelos caminhos da vida.
E ao que tudo indica meu filho Enzo veio com o cérebro dividido igual ao meu: pouca lógica, muita imaginação. Sempre foi aluno exemplar. Notas acima da média. Mas a matemática … ah, costuma andar no limite da aprovação. E quanto mais complexas vão se tornando as fórmulas, menos décimos ele consegue nas notas.
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Dia desses, ele chegou em casa cabisbaixo. “A prova foi difícil, mamãe. Sinto que não fui bem.” Tentei acalma-lo dizendo que às vezes a gente se engana nas percepções e que a nota poderia não ter sido tão ruim assim… Mas, nada. Ele passou o fim de semana ansioso com o resultado. Eis que na segunda-feira ele estica os braços de olhos fechados e me entrega a prova. “Mamãe, eu não vi a minha nota, mas sei que não foi boa e decidi que não quero saber quanto eu tirei.” Não, ele não viu que tirou quatro valendo 12.
Eu fui logo fazendo discurso. Argumentei que a gente precisa aprender a enfrentar os problemas de frente, sem medo. Falei que todos nós passamos por decepções ao longo da vida e que saber se reerguer é a parte mais importante do crescimento. Blá, blá, blá. Ele ouviu sem dizer uma palavra. Ao fim apenas repetiu: “mamãe, não quero saber a nota.”
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Ainda espantada com a firmeza dele, argumentei: “mas, como você vai saber quanto precisa tirar na próxima prova pra ter a média do bimestre?”. Ele olhou profundamente dentro dos meus olhos e disse: “eu preciso e vou tirar total”. Engoli seco e entendi. Ainda que a nota continue vermelha, a lição foi aprendida. E os aprendizados mais importantes da vida não costumam aparecer em um boletim de escola.
Filho, torço pra que você recupere a média e tire total na prova de matemática. Mas me importa mesmo é ver o seu esforço, me importa ver a sua determinação, me importa ver o brilho nos olhos de quem acredita em si mesmo. Na escola da vida, te dou nota máxima.
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]]>Amor de mãe. Filho vira a gente do avesso. E todo avesso é amarrotado
Portanto, acredite, não existe perfeição na maternidade. A poesia adora criar rimas com os corpos que se transformam pra gerar uma vida, mas vai sentir isso na pele? A palavras do poeta perdem completamente a delicadeza quando você está abraçada a um vaso sanitário colocando pra fora o que nem imaginava que existia dentro do seu estômago. E os enjoos são apenas os primeiros sinais de realidade batendo à sua porta. O corpo deixa de ser seu durante bem mais do que nove meses e essa generosidade feminina custa a privação de muita coisa.
Sim, mães costumam ser generosas. Mas é preciso desmistificar a gestação. A mulher lindamente barriguda das redes sociais tem vontade de fazer xixi toda hora, não encontra posição na cama na hora de dormir, sente dores nas costas, tem os pés inchados, a pele cheia de estria e muitos outros incômodos que não são descritos, nem fotografados.
E quando os filhos nascem? Eles saem do útero decretando o fim da sua liberdade. Eu chego a sentir saudade do tempo em que a única coisa que eu precisava dividir era meu corpo. Agora, compartilho meu tempo, meu dinheiro, minhas noites de sono, meus projetos de vida, meus sonhos…. E aí a gente olha aquele comercial de margarina e se pergunta: essas mães nunca sentiram vontade de sair correndo, sem nem deixar bilhete de despedida? Na minha casa, onde a vida é real, nossos cafés da manhã têm remela nos olhos, bafo, cabelo desgrenhado e correria contra o relógio.
Ser mãe não é ter uma foto linda de porta retrato. Ser mãe desinquieta a rotina e o coração. Escolhemos deixar de lado uma parte do nosso próprio querer em razão de um querer maior. Abdicamos. Muito. E essas escolhas nos custam sim. Eu não acredito em conto de fada, menos ainda na mulher maravilha. Não sou princesa, nem personagem infalível de cinema. Sou mulher cheia de contradições. Escolhi ser mãe e esse é o amor mais lindo que carrego no peito.
Mas nem sempre consigo oferecer o sorriso que eles precisam, o olhar cheio de doçura, a palavra de incentivo que não abala a autoestima. Muitas vezes perco a paciência, sou consumida pelo cansaço, tenho vontade de me esconder debaixo da cama pra não ouvir a palavra ‘mãe’. Já até engoli um chocolate inteiro pra não ter que dividir com meus filhos. Essa é minha vida de verdade. Sabe o que é mais bonito nisso tudo? É que meus filhos continuam acreditando que eu sou a melhor mãe do mundo. E eu, que conheci meu avesso, descobri que as imperfeições também têm lá sua poesia.
Foto: Cacá lanariO post Mãe de vida real apareceu primeiro em Jornal da Cidade BH.
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]]>Amor de mãe. A memória afetiva se forma de muitas maneiras e o cheiro, para mim, é a mais infalível delas
Semana Santa aparece no calendário e eu já começo a sentir aquele aroma de vela queimada. E é start para revisitar um passado que me enche de saudade.
Quando eu era pequena, meus avós maternos moravam numa cidadezinha chamada Ervália, lá na Zona da Mata mineira. E todo feriado santo minha família trocava o corre-corre da capital pelo sossego do interior. Meu avô tinha uma casa grande na praça principal. Um símbolo do contraditório. Era vizinho da igreja matriz e da boate da cidade. De um lado, o pecado, do outro a salvação.
Na Semana Santa tinha missa campal e a praça se enchia de fiéis atentos à pregação do Padre Joaquim e aos rituais de morte e ressurreição de Cristo. O padre mal dava a benção final e já começava o batido da música eletrônica convidando quem estava mais preocupado em salvar o corpo do que a alma.
Enquanto fui criança minha única opção era acompanhar a missa pela varanda e depois seguir a procissão. A diversão era cortar rodelas de papelão para enfiar a vela e proteger as mãos dos respingos de parafina. Quando virei adolescente, comecei a achar o vizinho esquerdo, das batidas eletrônicas, bem mais interessante. Minha mãe dizia que era tentação e me mandava prestar atenção à missa.
Foram muitos anos vivendo as mesmas experiências. Ouvindo o mesmo Padre Joaquim, acompanhando o movimento das beatas de sempre, fazendo o trajeto religioso que partia da praça, passava pela estrada velha e retornava à igreja matriz. Nada mudava. Aliás, ainda deve ser assim.
Eu cresci, meus avós morreram, a casa foi demolida. Já faz alguns anos que não visito o interior que me traz tantas lembranças boas. A cidade grande, onde moro, tem rituais católicos também, claro. Mas com outros cheiros. Quando a procissão acaba, não me assento à mesa grande cheia de primos ávidos pelos quitutes da vovó Zizita. Não existe o burburinho dos adultos que contam casos e celebram o encontro. Não há mais aquela espera ansiosa pelo domingo de Páscoa, quando a alegria era finalmente liberada. Na Sexta-feira da Paixão e no Sábado de Aleluia vovó cumpria o rito da sobriedade.
Por tudo isso, quando percebo a chegada da Semana Santa meu coração se aperta de saudade. Na cidade grande, faço o que posso para que o cheiro do feriado santo seja forte assim também para os meus filhos. Independentemente da religião, quero que eles sejam impregnados pela alegria de estar junto de quem a gente ama. As penitências, as procissões, as missas, os rituais serão escolhas individuais. Não interfiro nelas.
Mas cabe a mim construir histórias que lá na frente eles queiram revisitar. A memória do coração se fortalece nas vivências e nos afetos que elas carregam. Afetos que ensinam a perceber o cheiro raro de uma vela queimada.
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]]>Coluna. Meus filhos são gêmeos e têm personalidades distintas. Quase opostas. E gostos muito diferentes também
Por exemplo, um sempre teve vocação pro esporte. Ama futebol, como a maioria dos garotos da idade dele. O outro prefere criar suas próprias competições. Desde pequenininho, vivencia intensamente o mundo imaginário. É capaz de passar horas imerso na realidade que construiu. Até joga bola, mas com amigos astronautas durante uma fantasiosa viagem espacial.
Este ano eles mudaram de colégio e teve teste para os times de esporte da escola. Duas opções: futebol e handebol. A escolha do Francisco era óbvia: futebol. Enzo não queria fazer teste pra nada. Eu insisti, embora esporte também nunca tenha sido minha atividade preferida. Há os benefícios pra saúde, a socialização, enfim, é importante e ponto. Fiz a inscrição dele pro handebol, já que futebol estava fora de cogitação. E lá foi ele com passos lentos, os ombros encurvados pra frente, numa preguiça gigantesca de disputar a vaga que nunca quis ganhar.
Foram duas semanas de testes. O professor incentivava com aquelas frases típicas de encorajamento, palmas enérgicas e gritos. Pra corrigir e pra aplaudir. Eu espiava pela arquibancada a desenvoltura tímida de um menino pouco à vontade com a disputa. Enquanto isso, na quadra de futebol, Francisco esbanjava autoestima com a bola nos pés.
Na segunda semana de teste, pra minha surpresa, Enzo estufou o peito e entrou em quadra com uma desenvoltura diferente. E quando terminou o treino ele veio correndo pra me dizer: “mamãe, você viu como eu fui bom? Eu quero ser do time”. A alegria dele me congelou por dentro. Minhas vistas escureceram e minhas pernas ficaram bambas. Naquele instante tive certeza de que meu filho vivenciaria a primeira grande decepção da vida dele. E a culpa seria minha, afinal, a princípio, nem disputar a vaga ele queria. O resultado sairia no treino do dia seguinte e eu não tive mais sossego.
O resultado do futebol saiu primeiro e não houve surpresas. Francisco passou no teste e comemorou a vitória que ele nunca duvidou que teria. Nem eu. Foi numa terça-feira. Na quarta, sairia a escalação do time de handebol.
Na quarta cedinho peguei o telefone pra ligar pra escola. Tinha certeza de que eles entenderiam a situação. Meus filhos são gêmeos, um passar e outro não seria um trauma. Claro que compreenderiam. Mas, no segundo toque, desliguei o celular e chorei copiosamente. Compreendi a tempo que pedir a vaga pro meu filho não era meu direito.
Vencer e perder são construções da vida. O aprendizado está é no caminho. Evitar a frustração do meu filho não faria dele uma pessoa mais feliz. Lágrimas são lamentos de um coração que está aprendendo a se reconstruir. E a reconstrução é linda. A dor fortalece e ensina. O resultado da escalação? Enzo foi aprovado no teste. E tem andado por aí com ombros erguidos e sorriso de campeão. Claro que chorei de alegria. Claro que o coração de mãe agradeceu aliviado o adiamento das dores inevitáveis da vida. Segue o jogo.
Texto: Viviane Possato - [email protected]O post Amor de mãe: Jogo da vida apareceu primeiro em Jornal da Cidade BH.
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]]>Amor de mãe. O Natal de 2007 mudou minha vida. Mais precisamente, o pós-Natal de 2007. Foi na noite do dia 26 que a minha bolsa estourou
Saímos correndo pra maternidade e na madrugada do dia 27 de dezembro meus filhos nasceram. De lá pra cá, meu fim de ano ganhou uma festa a mais. Vem o Natal e, logo depois, a celebração dos gêmeos.
E o nascimento deles trouxe um desafio a mais pra minha vida: como ter convidados numa festa de aniversário dois dias depois do Natal e quatro dias antes do réveillon? Já tentei de tudo. Antecipei os parabéns para o início de dezembro, atrasei pra janeiro, arrisquei a data original… Nenhuma das alternativas deu muito certo. Quando eles completaram 7 anos tentei um formato diferente: piquenique com os amigos da escola.
Eu sempre gostei de organizar os aniversários dos meus filhos. Quero criar neles a memória afetiva que tenho. Minhas lembranças são tão doces! Guardo no coração cada imagem dos preparativos: minha mãe na cozinha fazendo o bolo, minhas tias enrolando os doces, a montagem da mesa com ajuda das vizinhas e eu espiando tudo cheia de expectativa. Gosto de fazer girar essa roda de afeto.
Então, lá fui eu colocar a mão na massa. Foi uma longa semana de afazeres: doces, cestas de palha enfeitadas, lembrancinhas cuidadosamente preparadas com o tema que os gêmeos escolheram para a festa. Tudo combinava. As cores dos balões, as toalhas de piquenique, copos, pratos, talheres! O azul e o amarelo tomaram conta da casa.
Naquele ano, Enzo e Francisco foram passar a semana de Natal na casa do pai deles e chegariam no dia da festa. Deixei tudo pronto pra ser uma surpresa! E foi. Quando eles se depararam com a festa montada, houve silêncio e sorrisos amarelos. “Gostaram, filhos?” “Mamãe, gostamos. Mas o desenho não era esse…”. Sim, eu errei o tema da festa de aniversário dos meus filhos. Errei o desenho, as cores!
Tive uma crise de risos, seguida de um choro compulsivo. Havia sido uma semana difícil pra mim. Sou jornalista e fiz plantão naquele Natal. Uma semana inteira trabalhando 12 horas por dia e ainda com uma festa infantil pra organizar. Estava esgotada e só conseguia pensar: que tipo de mãe erra o tema da festa de aniversário dos filhos?
Levei alguns minutos pra me refazer. Não tentei me justificar. Apenas pedi perdão. Eles sorriram me fazendo lembrar que eu já acertei tantas outras vezes! Meus filhos não exigiram uma solução, não me pediram pra refazer nada, não ficaram com cara fechada, não choraram. Festejaram os sete anos com a alegria de sempre. Como se tivessem tido a festa que sonharam. Quando eles sopraram as velinhas, eu agradeci a Deus pelos filhos que tenho.
A vida se faz e se refaz nos erros e acertos. Somos impecavelmente imperfeitos. Sonhamos colorido, mas nem sempre o caminho tem as cores que desejamos. Aos sete anos, meus filhos me ensinaram que todas as cores podem ser belas, inclusive as azuis e amarelas. Os temas? Ah, eles são tantos! Que em 2019 saibamos escrever belas histórias com os temas que a vida nos oferece.
Texto: Viviane Possato | [email protected]O post Eu erro, tu erras, mães erram apareceu primeiro em Jornal da Cidade BH.
]]>O post Amor de mãe | Quando eu perdi a fé apareceu primeiro em Jornal da Cidade BH.
]]>Foi no dia 27 de janeiro de 2007. Lembro do minuto exato em que deixei de acreditar em Deus. Carregava meu filho, embrulhado em uma manta amarela. Agarrava meu bebê como se ele ainda fosse meu. Mas o coraçãozinho já não batia mais. Perdi o sentido quando a médica pegou o Vitor dos meus braços. Sim, era preciso.
Quando retomei a consciência meu colo estava vazio e não havia mais a crença que me sustentava. São incontáveis as vezes em que me ajoelhei com a cabeça erguida para o céu suplicando pela vida dele. Em vão. Chovia muito no dia em que me despedi do Vitor. Não dormi naquela noite pensando na terra molhada e no filho que não podia ser aquecido. Tempos depois, busquei satisfação na Igreja.
Procurei um padre na esperança de encontrar explicações. Sou jornalista. Não me aquieto fácil. Sai de lá do jeito que entrei. Sem resposta, sem crença. Perdi o Vitor quando ele tinha exato um mês. Um mês de luta pela vida. Transfusões de sangue, paradas cardíacas, cirurgias no coração, no intestino.
E uma dor avassaladora no peito de uma mãe impotente diante do destino. Quase onze anos se passaram e ainda lateja. Como dói desfazer os sonhos. Não sei precisar quando, mas no meu caminho de reconstrução voltei a ter fé. Um dia busquei no fundo do armário minha imagem de Nossa Senhora Aparecida, tirei delicadamente a poeira e a coloquei de volta no meu quarto, ao lado da cama.
O meu luto teve revolta, teve rompimentos, teve desconstruções profundas de crenças e valores. Acho que eu comecei a me refazer quando deixei para trás a busca pela compreensão exata das coisas. Foi na dor mais profunda que percebi que não temos domínio de nada e que uma manhã de janeiro pode desconstruir todos os seus sonhos. E que você vai precisar se refazer porque outros janeiros virão.
Parei de buscar respostas e o fim dessa peregrinação trouxe aceitação. Voltei a me ajoelhar no chão com a cabeça erguida para o céu. Só que agora chamo por Deus e por um anjo meu.
Texto: Viviane PossatoO post Amor de mãe | Quando eu perdi a fé apareceu primeiro em Jornal da Cidade BH.
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]]>Amor de Mãe. Dia desses bateu um desassossego danado no peito. No meio da tarde, sem aviso, entre um gole e outro de café
Deu até tremedeira nas pernas. Fui invadida por uma certeza absurda: não posso morrer. Pensei em cada detalhe da brutalidade dessa ausência na vida dos meus filhos. Quem vai dar o aconchego rotineiro do boa noite? Quem garantiria a benção diária? A correção dos erros na medida do amor é coisa de mãe e de mais ninguém. Ai, meu Deus! Só eu entendo o significado de cada olhar, das palavras não ditas, do sorriso de canto de boca. Não, definitivamente, não posso partir.
O café sem açúcar ficou ainda mais amargo ao imaginar a adolescência. Como seria não testemunhar os primeiros amores? Imaginei cada confidência, cada descoberta, as intermináveis filosofias sobre a vida que ficariam pelo caminho.
Pulei o pensamento para vida adulta tentando um acalento. Não achei. Não, eles não poderiam seguir sem mim. A faculdade, a experiência de viver em outro país, as dores do amor, as madrugadas na balada, a formatura. Tem muita coisa pra compartilhar. Muito sonho para viver junto.
A essa altura já não havia prazer no café. Emburrei o rosto e me voltei pra Deus. Deus, nem pense nisso. Se está escrito aí no meu destino, por favor, apague. Juro que rezo o terço todos os dias, pago qualquer promessa que precisar. Mas não me tire de perto dos meus filhos.
A lágrima escorreu quando me dei conta de que mãe não tem direito de morrer. Todo filho que nasce deveria trazer junto um certificado do céu garantindo a vida materna enquanto houver precisão. Seria o justo. Doeu lembrar que a vida nem sempre é justa. Doeu lembrar que o controle não nos cabe. Doeu perceber a finitude.
Naquela tarde estranha, tratei de comer logo o chocolate que acompanhava o café para trazer de volta a doçura dos pensamentos. Fui pra casa, abracei meus filhos por um longo tempo e refiz meu compromisso de ser a melhor mãe que eu posso agora. Plantar sementes que germinem no tempo da colheita. Estar presente, no presente, fortalecendo os laços do coração. Os únicos que jamais serão desfeitos.
Texto: Viviane PossatoO post Certificado do céu apareceu primeiro em Jornal da Cidade BH.
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]]>Amor de mãe. Dia desses estávamos no interior de Minas, numa dessas cidadezinhas onde até o tic tac do relógio parece ter um ritmo diferente das metrópoles
No restaurante simples, com mesa de toalha xadrez, nos deliciávamos com um surubim ensopado quando Aninha, Enzo e Francisco tiveram uma ideia. “Vamos falar que somos trigêmeos!” “Mamãe, se o garçom perguntar, você pode dizer que somos trigêmeos?” E lá foram os três espalhar a “notícia” pelo restaurante.
Enzo e Francisco são gêmeos, têm 10 anos. Aninha, a filha que a vida me trouxe de presente, tem 9 anos. Eles são tão grudados que muita gente já me perguntou mesmo se são, de fato, trigêmeos. Mas nesse dia, vendo a vida passar mais devagar no interior, me peguei a pensar sobre esse amor.
Eles começaram a conviver bem pequenininhos, tinham três anos apenas. Cresceram juntos, em casas diferentes. Quanto mais o tempo ia passando, mais incompleta a vida ficava quando estavam distantes. Aninha mora no interior e vem pra gente a cada 15 dias. São filhos com a rotina, nem sempre fácil, de pais separados.
A cada 15 dias, a gente acorda mais feliz porque à noite a porta vai se abrir e lá estará ela arrastando a mala cor de rosa. A família completa é acalanto pro coração.
Lá no interior, meus olhos lacrimejaram enquanto observava os “trigêmeos”. Entendi que esse amor criou laços que jamais serão desfeitos. Não pari esses irmãos, o encontro foi acaso da vida. Mas, quer saber? A ligação sanguínea não faz falta. Eles me ensinaram que a conexão pelo afeto pode ser ainda mais forte. Eles se entendem irmãos, se percebem como irmãos, se amam como irmãos.
E lá vêm os três com sorriso no canto de boca. Felizes porque a moça do caixa acreditou na história dos trigêmeos. De longe, pisquei sem que percebessem e ela entendeu a brincadeira. Eu entendi também. Lá no coração, essa história tem sua verdade. E a verdade do coração é a que realmente importa.
Texto: Viviane PossatoO post Trigêmeos apareceu primeiro em Jornal da Cidade BH.
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]]>Amor de mãe, por Viviane Possato. Ai, vó, a saudade doeu nesses dias chuvosos. Que vontade de tomar aquele café melado com a senhora
Teria contado a você que já faz um tempo que só bebo café puro. Forte. Sem açúcar, sem adoçante. Imagino sua indignação disfarçada com doçura. Fecho os olhos e ouço sua voz: “a vida já não é amarga o suficiente, minha neta?”
Naquela mesa de madeira, forrada com plástico, teria sorrido ouvindo suas tagarelices rabugentas, que sempre acabavam com uma discreta gargalhada. Foi com a senhora que aprendi a rir de mim mesma.
Sabe, vó, naquela cozinha com piso de cimento teria acalmado meu coração observando a senhora sovar a massa e trançar a rosca com a delicadeza de quem passou a vida cuidando dos outros. Teria sido um acalento para a alma sentir aquele cheirinho bom de rosca fresca. Sempre no ponto certo. Nem torrada, nem crua. A gema do ovo espalhada na parte de cima da massa antes de ir ao forno garantia o tom corado, mas a senhora sempre soube o tempo exato das coisas. Das coisas da cozinha e das coisas da vida.
Vó, queria poder mostrar à senhora meus filhos crescidos. Sabe aquele truque da toalha com álcool na testa pra espantar febre alta? Também funciona com eles. Nessas horas, vó, a saudade aperta tanto que o ar costuma faltar. A lágrima escorre. Pelo sofrimento do filho e pelo sofrimento da mãe.
Ah, vó! Já ia me esquecendo. Nessa vida cheia de afazeres arrumei um tempinho pra fazer tricô. Queria tanto mostrar para a senhora meus primeiros enlaces. Ainda estou achando bem difícil, vó. Acho mesmo que não levo jeito, mas sigo fazendo as agulhas dançarem nas minhas mãos, enquanto minha memória encontra a senhora sentada naquele sofá cercada de linhas. Mas o crochê não deu, vó. Definitivamente, não herdei seu dom.
Outro dia, vi um mingau de milho com canela numa lanchonete. Nem lembrei de dieta. Pedi logo dois. Um para sentir o sabor, outro para saciar a saudade. Ia pedir o terceiro, mas me dei conta de que em nenhum deles encontraria o que buscava. Não teria seus ingredientes, vó. A base era a mesma: milho e leite. Mas não estava na geladeira da cozinha com piso de cimento. Não seria servido na mesa forrada com plástico. Não iria ouvir a senhora contando os casos da infância pobre em Dom Silvério.
A chuva segue despejando água e saudade, vó. Quanta coisa para contar. Quanto aconchego para sentir.
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]]>Saúde é aquela história: a gente tem e nem bota reparo, mas vai ela falhar pra ver.
Por Viviane Possato
A gente se agarra a tudo quanto é santo. Doença faz até ateu passar água benta na testa. Vai que, né? A gente faz simpatia, busca erva curandeira no Google e fica carente. Carente de colo, de cafuné, de sopa de mãe, de risada de amiga. Carente e ponto. Carência é direito adquirido de doente.
Outro dia, peguei esse tipo de carência. E a mãe, que também é filha, quis não precisar cuidar de filho. Desejei não ter que me levantar para fazer café, não acompanhar tarefa de escola, não administrar briga de irmão, não levar filho ao dentista. Nossa, como desejei! Por alguns minutos, quis voltar para o lugar de quem apenas se recosta no peito do outro.
Teria chorado esse dia. As lágrimas até ensaiaram descer, mas foram interrompidas abruptamente. Enquanto desejava não cuidar, o cuidado me chegou. Enzo e Francisco entraram no meu quarto carregando desengonçadamente uma bandeja de café da manhã e perguntando: “está melhor, mamãe?” A bandeja tinha mamão picado, geleia de amora, torradas e bilhetes cheios de coração, me fazendo lembrar que eu ensinei cuidar. Meus filhos, de dez anos, aprenderam sobre o amor.
Não que a gente ame apostando na lei do retorno. Mas se tem uma coisa que esse universo devolve é amor. E é deliciosa a colheita. Na minha casa, a gente deixa recadinhos de amor perto da xícara de café, a gente aperta a bochecha um do outro, a gente se espreme debaixo do cobertor até sentir calor. A gente fica junto, no clichê da alegria e da tristeza. Aprendi assim, ensinei assim. E assim seguimos perpetuando o amor que sabe amar.
Amar é aprendizado. É sentimento que brota no coração, mas só se fortalece na ação. Amor precisa ser sentido com as mãos, precisa ser traduzido em palavras e refletido no fundo dos olhos. Sentir não basta. Tem que amar e saber amar. Tem que mostrar, tem que dizer, tem que aconchegar, tem que amparar. Tem, senão é melhor nem ter. Amar sem saber amar não acrescenta.
Um dia cheguei a pensar que quanto mais a gente se doa, maior o risco da desilusão. Sofri querendo camuflar o que tenho de mais bonito até decidir que, no meu peito, amor não se esconde. Se ele quiser, que busque outro esconderijo. Não faço morada para o medo. Amor eu sinto e mostro. É a minha verdade.
Ah, filhos! Naquele dia o meu peito se encheu de gratidão. O café estava delicioso. Tive coragem para me levantar e enfrentar o que era preciso. A vida vai ensinar a vocês que a gente se fortalece é no caminhar. E na certeza de que as pernas podem até bambear (e bambeiam), mas se aprumam melhor quando existe amparo. E só sabe amparar, meus filhos, quem entende de amor.
Foto: Divulgação
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]]>Amor de mãe, por Viviane Possato. Não me pergunte se é energia, sinergia, afinidade, espiritualidade, campo magnético, corpo físico. Não sei a razão, a explicação, a origem
Sobre amor de gêmeos, sei apenas o que testemunho. E asseguro: não existe amor igual.
Enzo e Francisco nasceram prematuros e foi no CTI que comecei a me dar conta das singularidades dessa conexão. No hospital, eles passaram por muitos perrengues, mas nunca ao mesmo tempo. Um só tinha recaída quando o outro dava sinais de melhora. Foi assim nos três meses de internação. Como se entendessem que a mãe, naquele momento, não podia ser disputada. E aí fui aprendendo sobre generosidade.
Em casa, houve cólicas combinadas, choros simultâneos, pirraças duplas, mas eles sabiam exatamente o momento de parar a competição de colo. E nem precisava medir a febre do irmão.
Ano após ano, fui aumentando a coleção de momentos curiosos. Sabe aquela suspirada gostosa no meio da madrugada para ajeitar o corpo no berço, mudando de posição? Podia marcar no relógio. Enzo e Francisco não falhavam. Viravam os corpinhos ao mesmo tempo, sempre. Vontade de fazer xixi? No mesmo minuto. Até hoje correm juntos pro banheiro. E restaurante self service? Um escolhe macarrão. O outro arroz com feijão. Na hora de pesar? Igual. Peso idêntico. Mesmo grama.
E são cúmplices, né? Quando eram pequenininhos, combinavam as travessuras pelo olhar. Um dia explodiram a tomada do quarto. Eu nunca soube o que, de fato, aconteceu. E assim fui aprendendo sobre lealdade.
Sustos? Nossa. Foram muitos. Um deles por descuido meu. Enzo e Francisco abriram a caixa de remédios. Francisco pegou o frasco de bolinhas homeopáticas, mas não abriu. Enzo escolheu a caixa de tarja preta e bebeu rivotril. Se existe mesmo anjo da guarda tenho certeza de que ele é mais poderoso do que a cumplicidade de gêmeos. Não sei como, nem o porquê, mas Francisco percebeu a gravidade e, num gesto raro, delatou o irmão. E assim aprendi que mães precisam se perdoar. Não foi fácil.
A verdade é que eles já se salvaram muitas vezes. Um dia, Francisco estava prestes a tomar uma agulhada na sala de vacinação quando Enzo começou a chorar sem parar. Tive que interromper a técnica de enfermagem para ver o que estava acontecendo e acabei me dando conta de que estava vacinando o menino errado. Fran já havia tomado a dose. Tempos depois, em uma das muitas madrugadas em claro, quase troquei as mamadeiras. Enzo tomava um leite especial porque tinha intolerância à lactose. Se não fosse Francisco acordar chorando, o irmão teria tomado a mamadeira errada. Comecei a aprender que para algumas coisas a gente simplesmente não encontra explicação lógica.
É assim, observando esse amor, que vou aprendendo a ser mãe de gêmeos. Um amor que tem sua própria história, suas próprias conexões. Um amor que ultrapassa a lógica, que parece pulsar no universo antes de chegar ao coração. Um amor que gerei, mas que não me pertence. Um amor do qual sou apenas espectadora. E assim sigo aprendendo que amor, para ser amor mesmo, carece de desapego.
Foto: Divulgação
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]]>Carta para mim, por Viviane Possato. Oi, mamãe. Queremos dizer umas palavras para você. Sabemos da sua história, do quanto você sonhou com a nossa chegada
Deixar a rotina agitada para viver como chocadeira não é fácil não, né? Contamos o tempo com você. As horas passam devagar demais em cima de uma cama. Quatro meses praticamente sem se mexer. A gente sentia seus desejos: a vontade de passear, de ver a vida acontecer, de movimentar o corpo. Mas, você colocou todos eles em segundo plano porque sabia que precisávamos do seu corpo em repouso.
Aí chegamos te dando um susto danado! Você fez o que podia, mas apressamos nossa vinda. Claro, não estávamos prontos aos sete meses de gestação. Lutamos demais pela vida na UTI e tivemos você ao nosso lado em cada batalha. Ouvíamos suas cantigas de ninar ao lado da incubadora, percebíamos os sussurros da sua fé, enxergávamos suas lágrimas, mas, principalmente, sentíamos a esperança que vinha do seu amor. Lembra daquelas noites em que você se recusava a ir embora do hospital e dormia no banco do corredor? A gente sentia você por perto, mamãe.
Quando nossos irmãos morreram, pensamos que você perderia a força. Mas você nunca desistiu de nós. A gente se lembra de quando você sussurrou pelo vidro da incubadora: “existe muita vida à nossa espera. Lutem”. Lutamos e vencemos. A gente sabe o quanto doeu em você se refazer por nós.
Fora do hospital ainda tivemos muitas batalhas. Internações, cirurgias, corridas para emergência. Sustos! Muitos sustos! Incontáveis madrugadas em claro. Só nós três sabemos né, mamãe? Somos cúmplices nos choros noturnos. Mas sabe o que a nossa memória mais guarda daquele tempo? O sorriso que sempre surgia no seu rosto, mesmo que os olhos ainda estivessem cobertos de lágrimas.
As coisas andaram difíceis quando a gente cresceu um pouquinho, né? A separação, o recomeço…. Vieram outras muitas madrugadas em claro. Não mais para acudir o choro de cólica, mas para garantir o sustento. Testemunhamos o quanto você trabalhou para que não faltasse nada.
Mamãe, você nunca escondeu as lágrimas quando a vida se fez dura demais. Mas a gente aprendeu com você que quase tudo se refaz no amanhecer. Sua força nos aconchega.
Não, essa carta não foi escrita pelos meus filhos. Eles são crianças se ocupando da infância, como deve ser. Eu mesma escrevi. Para mim e para tantas mães, com tantas outras belas histórias! Não escrevo pelo pieguismo do discurso de merecimento não. Escrevo porque não me canso de achar lindo o tal amor de mãe. Escrevo porque cada linha dessa história me transformou profundamente e me fez melhor. Escrevo por reconhecer no meu peito a beleza de um amor incondicional. Feliz dia da mães!
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]]>Chinelo 37, por Viviane Possato. Era só um chinelo arrebentado. Uma cena cotidiana
Eu, para variar, estava apressada enquanto Francisco mostrava as tiras soltas e reclamava que ia ter que sair descalço. Eu catei a bolsa e saí gritando pelo corredor: qual é mesmo seu número filho? Vou comprar na farmácia. “37, mamãe!”, ele gritou de lá. A resposta me causou um certo estranhamento, mas susto mesmo eu levei lá na farmácia quando peguei o par de chinelos nas mãos. Fiquei alguns segundos paralisada tentando entender o que havia acontecido com meu bebê. Isso é um pé de adulto. 37? Não pode. Liguei: “filho, dá uma conferida aí porque você deve ter se confundido. Você não calça 37 não, meu amor”. Foi quando ouvi o que meus olhos se negavam a enxergar.
Os filhos crescem. O tempo corre mais ligeiro do que a gente gostaria. De repente, aquela pressa toda que me fez sair de casa correndo perdeu o sentido. Os passos até o carro foram mais lentos. No caminho de volta para casa, não houve a rotineira inquietação com o motorista da frente que demorou a arrancar quando o sinal se abriu. O par de chinelos 37 jogado no banco do carro fazia latejar a certeza da finitude da infância e da vida. A urgência naquele momento era apenas encontrar uma resposta: o que estou construindo com o tempo que tenho?
Os quatro ou cinco quarteirões que separam minha casa da farmácia foram suficientes para me fazer revisitar uma vida inteira. Repassei a existência limpo. De forma especial, voltei minhas lembranças para os últimos dez anos. A gravidez difícil, os nascimentos, a luta pela sobrevivência no CTI, os primeiros passos, os primeiros dentes, as primeiras palavras, as alegrias, as dores, as reviravoltas da vida. Sorri, enquanto algumas lágrimas desceram pelo canto dos olhos. A nostalgia me fez lembrar das palavras da minha avó: “a vida passa rápido demais, minha neta” e o coração apertou mais do que eu gostaria. Senti culpa, medo, até duvidei de algumas escolhas. Mas cheguei em casa a tempo de não me arrepender de nada. Ufa. Ainda bem que moro perto da farmácia.
Francisco veio pelo corredor, pegou o par de chinelos, enfiou nos pés, me deu um beijo rápido no rosto e seguiu. Mais uma vez, o cotidiano tomou o lugar dos conflitos da existência. A essa altura, eu estava, de fato, atrasada para o trabalho e, também, precisei seguir meu caminho. É assim, com o correr da vida, que vamos nos esquecendo dos chinelos 37. Vamos deixando para depois aquela partida de futebol com as crianças, aquele momento só para eles, aquele aconchego sem pressa. Vamos nos esquecendo da finitude acreditando sempre que os chinelos vão se arrebentar mais uma vez. Seguimos com a arrogante certeza de que a vida nos dará outra chance. Tomara que as tiras ainda tenham conserto e que o par de chinelos ainda caiba nos pés.
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]]>O post Páscoa com sabor de infância apareceu primeiro em Jornal da Cidade BH.
]]>Amor de mãe. Pegadas de coelho espalhadas pelo chão são pista importante. Ufa, ele se lembrou de mim.
Mas, cadê meu ovo? Será que ele trouxe o que eu pedi? As pistas me conduzem. Espio debaixo do sofá, dentro do armário do banheiro, atrás da porta. Encontro ovinhos pelo caminho! Oba! Ele veio mesmo! Tenho certeza que ele deixou um ovo grandão também! Mas, onde? Corro, vasculho, quase desisto e de repente: acheeeeei! “Mamãe, acheeeeeei!”.
Testemunho essa cena há alguns anos e a alegria enche meu coração toda vez que vejo um filho entrar pelo quarto carregando cheio de orgulho o ovo que o coelhinho da páscoa deixou. “Era o que eu queria, mamãe! Ele adivinhou!” Devolvo a alegria com um sorriso de gratidão. Que delícia! Mais uma Páscoa com o doce sabor da imaginação.
Francisco e Enzo completaram 10 anos. Aninha, já está quase com 9 anos. Pensei: ah, já deu! Nesta Páscoa, vou dar a real, eles já devem estar rindo de mim com essa história de coelhinho da Páscoa. Aí, dia desses, saindo do cinema, perguntei: qual ovo vocês vão querer neste ano? Vamos olhar na Drogaria Araújo e nas lojas Americanas como estão os preços para fazer uma pesquisa?
Eis que ouvi o inacreditável: “Por que, mamãe?”, indagou Francisco. Enquanto eu formulava a resposta, Enzo se antecipou: “Você não sabe da crise, Francisco?”. “É mesmo! O coelhinho tem muitas crianças pra atender, acha que ele tem dinheiro sobrando?”, completou Aninha. Engasguei com a água que bebia enquanto, em silêncio, repetia para mim mesma: “bem feito pra você!”
Alguém pode me dizer por onde andava minha cabeça quando pensei em pôr fim à fantasia de uma criança? Por que temos o péssimo hábito de querer antecipar a vida adulta? Logo, eu! Tão cuidadosa com a imaginação, tão zelosa com a infância! Tratei de me refazer rapidamente e segui pelo mundo deles: “Isso mesmo! Podemos ajudar o coelhinho a economizar, né? O que acham?”
Gente, eu juro com mindinho cruzado que nunca mais me atrevo a interferir no trabalho de um coelhinho da Páscoa. Debaixo das cartinhas dos meus filhos, deixei a minha: “Coelhinho, por favor, aceite meu pedido de perdão. Vou deixar umas cenouras espalhadas pela cozinha e pela sala, tá? Pode se lambuzar à vontade. Se der, deixe pra mim um ovinho de chocolate amargo? Não! Não tô sentindo amargura no peito, não. É só predileção mesmo! Na verdade, acho a vida doce que nem chocolate! Obrigada, beijo de uma mãe errante.”
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]]>Amor de mãe. Meu pai cresceu na estrada acompanhando vovô Possato ao volante
A vida ia se fazendo de parada em parada, de cidade em cidade. Em alguns lugares, havia pouso; em outros, dava nem tempo de criar laços. Lá pelas tantas, numa cidadezinha da zona da mata mineira, papai se encantou pela filha de seu Agostinho da farmácia. Colocou aliança no dedo, se ajoelhou no altar pra prometer amor até que a morte separe e formou família. Só que nem casamento segurou o moço de olhos verdes que gostava de desbravar estradas. Vovó Zizita bem que tentou aquietar a filha, mas mamãe escolheu seguir com ele pela vida itinerante.
Meu irmão mais velho nasceu no norte de Minas e ainda era bebê de colo quando papai decidiu que era hora de mais uma partida. Mamãe fez as malas de novo, cheia de entusiasmo, com destino à capital. Eles estacionaram em Belo Horizonte com a promessa de que o endereço, dessa vez, duraria mais tempo. Durou.
Nessas ironias de destino, o moço aventureiro acabou se fixando no mesmo endereço por quatro décadas. Uma casa de esquina na rua com nome de instrumento musical. Mais três filhos nasceram. Lá, tivemos infância, crescemos, nos formamos, nos casamos, dissemos adeus pra seguir nossos próprios passos. Papai e mamãe continuaram no mesmo lugar esperando pelos netos. Vieram sete e chuparam jabuticaba no mesmo pé onde eu e meus irmãos nos lambuzamos tantas vezes! A casa passou por algumas reformas até ficar quase do jeito que eles sonharam. Quase! Ah, esse destino…
O moço de olhos verdes e a moça apaixonada nunca deixaram de sonhar. Perto de completarem 70 anos de vida, decidiram que era hora de outro recomeço. Uma notícia dessas faz a gente até duvidar se a sanidade anda boa… E o pensamento de filha egoísta segue: mas, vai nos deixar aqui? Morar em outra cidade? Mas e nossos almoços de domingo? A saudade? O amparo com os netos? A certeza de um café coado na hora em qualquer momento do dia? Como assim? A essa altura da vida?
Sim, pai. Sim, mãe. A qualquer altura! Que orgulho imenso enxergar a vida se renovar nos olhos enrugados. Que lindo ver o sonho renascer no horizonte de quem já deu tantos passos. Que privilégio perceber leveza nos ombros de quem poderia ter se curvado pelas dores da caminhada, mas escolheu a liberdade do desapego. Obrigada por me ensinarem tanto sobre amor e recomeço.
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]]>Quando eu era pequena, sofria com fortes crises de bronquite
O termômetro batia na casa dos 40 graus com uma facilidade danada. Até hoje me lembro de ver bolas coloridas sobrevoando o meu quarto e sentir as paredes vindo em minha direção. Remédios ajudavam, mas o que fazia os delírios cessarem de vez era cafuné de mãe. Era só sentir o cheiro dela por perto que a realidade voltava, a respiração acalmava, o corpo sossegava.
Mais crescida, era pra casa de vó que eu corria toda vez que alguma coisa desandava. Gripe, dor de cabeça, piolho, joelho ralado, coração partido. Tudo era motivo para atravessar o bairro e bater no portão da rua Mário Soares. Lá, a mesa estava sempre posta, com um bolo debaixo do pano de prato e rosca fresquinha. O restante variava conforme o mal. Gripe? Canja de galinha. Dor de cabeça? Toalha molhada com álcool na testa. Piolho? Alpendre, pano branco, pente fino e muita prosa. Joelho ralado? Curativo e doce. Coração partido? Conversa debaixo do pé de goiaba.
Vovó tinha um remédio infalível pra todo tipo de mal: pena de ganso. Isso mesmo, pena de ganso. A aplicação é bem simples: ajeita o corpo no sofá, coloca a cabeça no colo de vó, fecha os olhos e sinta aquela penugem percorrer seu rosto com delicadeza. Não há pressa. Avós não se deixam levar pelo ritmo dos relógios. Elas já sabem que a vida carece de respiro. Na casa de vovó, a pena milagrosa ficava no armário da sala, sempre a postos para acolher neto aflito. Acredite, ela já curou muita dor na família. Dor de corpo e dor de alma.
Quando virei mãe, descobri que meu beijo também tem poder de cura. É a coisa mais engraçada: o menino cai, chega pedindo socorro, cheio de lágrimas e dengo. Mas é só o beijo estalar no machucado que todo mal se vai em segundos.
Não tenho mais casa de vó, mas memória de coração ninguém apaga. É para o canto das recordações que eu ainda corro sempre que o ritmo da vida se descompassa. Lembrança deixada pelo afeto é refúgio seguro. Lugar que não se toma. Lugar nosso. Não há quem leve de nós.
A vida é feita de muitas construções, passamos por muitos lugares, nos enlaçamos em diversas outras histórias, fazemos morada em um tanto de coração. Eu mesma sou pessoa de sorte. Tenho família unida e amigos que enchem meu peito de gratidão. Só que a vida tem lá seus desassossegos, né? E desassossego quando resolve ser desassossegado só se sossega com pena de ganso. Ainda bem que estoquei um monte delas no coração.
Texto: Viviane Possato
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]]>Eu testemunhei a descoberta do paladar, o balbuciar das primeiras sílabas, os passos desengonçados que te mostraram o mundo de um ângulo diferente. Vi sua mãozinha pegar o lápis e juntar as letras que formam o nome que escolhi com tanto amor. Que alegria foi poder testemunhar a conquista do primeiro diploma. O sorriso escancarado quando andou de bicicleta sem rodinhas? Eu registrei. Na memória e na fotografia.
A vida também me permitiu testemunhar a queda que te deu a primeira cicatriz no rosto: 5 pontos. A dor foi grande, no seu corpo e no meu coração. Naquela sala de hospital, fixamos nossos olhares um no outro e nos amparamos na cumplicidade, enquanto o cirurgião costurava sua pele. Quando perdeu as olimpíadas da escola, aplaudi o seu aprendizado, o entendimento doído de que a vida nem sempre nos oferece a vitória. A derrota faz parte da caminhada, apesar dos nossos esforços, das nossas tentativas, dos nossos desejos.
Dia desses me surpreendi testemunhando seus olhos brilharem de um jeito diferente ao falar da coleguinha da escola que adora fazer as tarefas ao seu lado. Senti um aperto no peito ao perceber que daqui para frente seus passos vão depender menos do meu amparo. Os amigos da adolescência vão chegar monopolizando seu tempo e sua atenção. Virão os amores. Ah, os amores ! Pensei de súbito: vou para o escanteio.
Lamento? Que nada. No escanteio, na arquibancada, no camarote, dividindo a bola em campo, não me importa. De qualquer lugar, continuarei testemunhando sua vida, meu filho. E que privilégio o meu! Acho que ser mãe é isso. Testemunhar a vida do outro do lugar mais especial que existe. A vida não é nossa, não nos pertence, portanto, não nos cabe determinar seu rumo. O que nos cabe é testemunhar as escolhas, as conquistas, os tombos pelo caminho. Testemunhar amparando quando se fizer necessário. Testemunhar aplaudindo, sorrindo junto, alegrando-se com cada passo acertado. Testemunhar enxugando as lágrimas, tentando mostrar outras rotas, oferecendo colo.
Meu filho, se você me permitir, vou seguir testemunhando sua vida com os olhos bem atentos, com os ouvidos prontos para acolher seus desabafos, com as mesmas palavras firmes e cheias de afeto que nos conduziram até aqui. O meu lugar é no seu coração. É de lá que testemunho tudo. É de lá que sinto quando preciso correr para o campo de futebol e dividir a bola com você ou quando devo ocupar a arquibancada para torcer e aplaudir seus gols.
Texto: Viviane Possato
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]]>Era uma manhã de terça-feira, quando Francisco e Enzo acordaram ouvindo meus soluços. Os olhinhos assustados perguntavam sem precisar de palavras. Respondi: “a mamãe perdeu um amigo muito especial”. Eles me envolveram em um abraço forte como se quisessem dizer: “a gente também te dá colo, mamãe”. Eu me amparei no amor de filho com a certeza de que as relações precisam ser construídas com verdade, desde sempre. Quero que meus filhos cresçam entendendo que a dor é parte da vida, que existem partidas que nos roubam o ar e que leva tempo pra gente conseguir suspirar sem angústia.
Aquela terça-feira é muito recente e a vida ainda parece fora do lugar. A partida de alguém que amamos sacoleja tudo. De repente, o que parecia tão importante passa a não ter tanto sentido, a gente perde a pressa, inverte as prioridades, deseja que o tempo volte pra terminar a frase que ficou incompleta, pedir a desculpa que o orgulho impediu, dar o abraço que foi ficando pra depois até se perder pra sempre. A gente sempre acha que vai ter mais uma chance até ser apanhado pela finitude.
Mestre, essas palavras não te alcançam mais, mas preciso escrevê-las. Escrevo por gratidão. Conheci o Artur Almeida quando entrei para a Globominas, em 2003, e me lembro da primeira vez que ele me chamou numa entrada ao vivo: “vamos falar com a repórter Viviane Possato ….”. Pensei: nossa, que honra! Desde a época em que eu era estudante de jornalismo, admirava a seriedade com que o Artur cobrava respostas das autoridades. Um mestre incansável na busca do jornalismo com olhar social. Como era legal ver a essência do jornalismo brilhando nos seus olhos, apesar dos pesares.
Os anos de convivência na redação me fizeram enxergar um pouco mais: que ética rara você carregava, meu caro. Que privilégio conhecer alguém assim, tão inflexível nas questões em que não deve haver espaço para o “talvez”. Levei um tempo para ver que, em você, seriedade não era sinônimo de sisudez. Que humor delicioso você tinha!
Mas foi esta coluna, “Amor de mãe”, que me levou para mais perto de você e me fez conhecer uma generosidade incomum. Que pena não ter tido tempo de dizer obrigada. Obrigada por querer ler a coluna antes de todo mundo e por apontar de forma tão respeitosa as mudanças que considerava necessárias. Obrigada por ser tão elegante quando eu não “obedecia” às suas considerações. Obrigada por me incentivar tanto, tanto, tanto! Obrigada por querer ajudar, sem esperar nada em troca.
Ai, mestre, reencontrar o sentido do jornalismo ficou mais difícil agora. Mas, a gente vai seguir buscando o exemplo de seus passos, apesar dos pesares. Complicado mesmo vai ser aprender a te encontrar só no passado. O tempo vai se encarregar disso, eu sei. A serenidade vai tomar o lugar da angústia e, aos poucos, a vida se rearranja. O lamento por ter sido tão breve vai ficar no coração, mas não será maior do que a gratidão por ter feito parte da minha caminhada. Que honra, mestre!
Foto: Cacá Lanari
Texto: Viviane Possato, jornalista, mãe de Enzo e de Francisco – Coluna Amor de Mãe
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]]>Dia dos pais. “Como a maioria dos homens, antes de ser pai eu pensava em me casar e programar a realização deste sonho. Até o dia em que fui surpreendido com a notícia que iria, de fato, transformar meu mundo. Foi um dos dias mais felizes da minha vida! Era perto do meu aniversário e sem dúvidas foi o melhor presente que recebi naquele ano e que desde então se tornou o melhor da minha vida!
No dia 8 de fevereiro de 2008 o Davi nasceu, e com ele nasceu em mim uma vontade enorme de ser o melhor pai do mundo! Fui em busca de conhecimento, pois percebi que não poderia educá-lo apenas com as referências que eu tinha. Minhas prioridades mudaram, e meu desenvolvimento espiritual e moral também precisou ser aprimorado. Desde então, eu tive a certeza que eu seria não o melhor pai do mundo, mas, sim, o melhor pai que meu filho poderia ter!
Quando ele tinha apenas três anos, eu já estava me separando da mãe dele e passando por uma situação financeira bem complicada. Eu me sentia extremamente preocupado com a “felicidade material” dele e o questionei: filho, o papai está muito preocupado com você, gostaria de saber o que eu posso fazer para que seja feliz? Escutei uma das maiores lições da minha vida. “Papai, eu já tenho de tudo, eu tenho você e sou muito feliz, não preciso de mais nada!”. Neste dia aprendi que para ser feliz é preciso ter amor, respeito, afeto, carinho, atenção, reciprocidade, diálogo… entre tantas outras atitudes que cultivam o ser e não as que “compram o ser”.
Participo de um curso de pais há mais de cinco anos e também de vários seminários, palestras e outros cursos para me ajudar e ajudar outros pais. Também sou esportista e voluntário, percebo que essas atividades favorecessem na educação do meu filho. O esporte é um extraordinário aliado para a evolução do ser e ainda melhor são as experiências que vivemos servindo ao próximo em nossas atividades sociais.
Continuo na busca diária do aprimoramento. Ser pai para mim é mais que estar ao lado ou cultivar a posição.
Ser pai é assumir a posição de educar, dar bons exemplos. É estar disposto a combater meus vícios e ignorâncias em prol do bem-estar do meu filho!” Vinicius, pai de Davi.
O verdadeiro sentido da palavra pai
Amor, carinho, cuidado e respeito. Essas são palavras que vem à mente do adolescente Marcos Nunes de Moraes quando se trata de seu pai, o artista plástico Glauco Moraes. Sem nenhum problema, pelo contrário, com muito orgulho ele conta a todos que é adotado.
Em um período em que não era muito fácil um homem solteiro adotar uma criança no Brasil, o destino uniu pai e filho, e Glauco e Marcos se cruzaram num orfanato em BH. Solteiro, mas, com muita vontade de ser pai, Glauco Moraes procurou, em 2006, o Juizado da Infância e da Juventude para dar inicio ao processo de doação.
“Nas entrevistas das quais participei disse que queria uma criança entre 0 a 4 anos. Mas, quando encontrei o Marcos, na época com seis anos e meio, tudo mudou! No abrigo, ele veio até mim, me deu um abraço e um beijo. Ali, na hora, senti que ele era o meu filho! Não tive dúvidas e comecei o processo para sua adoção”, relembra Glauco Moraes.
Essa linda história, como a do artista plástico e de seu filho, vem crescendo no país, segundo estatísticas, o número de pais solteiros cresceu 28% entre 1993 e 2006. Já de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre as famílias com filhos, 11,7% tem como referência alguém do sexo masculino e sem cônjuge. Isto é, um homem chefiando a família sozinha.
Próximo ao Dia dos Pais e Dia do Solteiro, respectivamente comemorados nos dias 14 e 15 de agosto, essa escolha de Glauco e Marcos Moraes por doar e receber o amor e formar uma família é um belo exemplo. Apesar das convenções sociais estarem mudando, o pai solteiro passa por diversas dificuldades e, como podemos ver, os homens podem dar conta dessa função muito bem.
A sociedade começa a entender essa realidade de mudança. Em 2016 passou a valer o pacote de licença paternidade de 20 dias para servidores federais e empresas que adotam o programa Empresa Cidadã. Um avanço importante, uma vez que, segundo Glauco Moraes, em sua época ele teve dificuldades para fazer a certidão de nascimento de Marcos. “No cartório tiveram que chamar um técnico em informática para alterar o programa utilizado pela instituição. Isso porque, ao registrar uma criança não existia a possibilidade de pular o nome da mãe ou colocar como inexistente!”, relembra o artista plástico.
A emoção de ser pai me pegou no primeiro momento
“Nunca tinha pensado nisso, mas, na verdade, tinha medo de ser pai. Quando a Bia nasceu descobri um sentimento que nunca havia conhecido. Descobri também que essa é a melhor parte da vida. Entendi o que é o amor. Mesmo após o término do casamento, a amizade entre nós continuou e isso facilita a convivência. O apoio da minha mãe também é enorme e isso ajuda muito. Há alguns anos saí de Brasília, mas, faço o que for necessário para poder estar com ela a cada quinze dias, e vou às festas da escola sempre que possível. Hoje, a tecnologia ajuda e com as chamadas de vídeo conseguimos nos ver e participar das coisas do dia a dia. A presença é muito importante para ela e para mim também. A nossa relação cresce e à medida que ela fica mais velha temos mais amizade. Ela é minha parceira de aventuras, viagens, cinema etc.
Os tempos modernos ajudaram na mudança das famílias, mas, ser pai é uma dádiva e vale todo o sacrifício para acompanhar o crescimento e a vida da minha pequena.” Rodrigo Bacella, pai de Bia
Foto: Arquivo Pessoal
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]]>Amor de mãe. Eles dividiram a barriga, o alimento, o afeto. Chegaram ao mundo com uma diferença de dois minutos
Têm o mesmo signo, regido pelo mesmo planeta. De mim, receberam a mesma educação. Cresceram ouvindo os mesmos sermões, o que não pode pra um, não pode pro outro. Na minha casa, a regra é única, o princípio moral o mesmo.
Meus filhos são gêmeos e gêmeos têm uma sintonia linda de se observar. Quando eles eram bebezinhos e eu entrava no quarto de madrugada pra ver se tudo ia bem (sim, mãe tem dessas loucuras) eu me deparava com uma cena de arrepiar: eles mexiam na cama no mesmo segundo, virando pro mesmo lado, se ajeitavam e suspiravam juntos. Na primeira vez pensei: coincidência! Que nada. Eles estão com nove anos e até hoje vejo o mesmo remexer durante as madrugadas. Ainda acho graça ao vê-los correndo pro banheiro ao mesmo tempo. A dor de barriga vem em dose dupla! E no restaurante self service? Pratos idênticos, os mesmos gramas, os mesmos centavos a pagar! Incrível.
Iguais? Não, opostos! Não é exagero de mãe. O-pos-tos. Sol e lua. Água e fogo. Doce e azedo. Um é grude, o outro corre de abraço. Um é perfeccionista, responsável. O outro? Malandro, leva a vida na flauta. Um é flexível, se molda com o que tem, enquanto o outro é ferro, quando decide, não arreda o pé.
Às vezes, tanta diferença ecoa em berros: “eu quero ser sozinho!!!!!” Eu interfiro, peço calma, tento mediar o conflito, mas no fundo, no fundo, acho graça e penso cá com meus botões: reivindicação justa essa! Afinal de contas, a aceitação da diferença passa pela descoberta da individualidade. É olhando pra dentro que a gente se descobre por inteiro, sem a sombra do outro, sem o exemplo do outro, sem a expectativa do outro. Amadurecer é verbo que se conjuga na solidão.
A maturidade nos ajuda a enxergar melhor a beleza que existe na diferença. É com maturidade que a gente se despe dos julgamentos, da arrogância, da falta de modéstia. Diferente não é melhor. Diferente não é pior. Diferente é diferente. Não é igual. Apenas isso.
É na aceitação da diferença que a gente se aproxima do outro de forma mais verdadeira e as relações de amor só se constroem quando existe verdade. Eu aprendi que a gente não deve olhar pro outro esperando que ele seja espelho. O outro deve ser enxergado como ele é, sem imposições de mudança, com respeito às escolhas e aos caminhos que não são nossos. Acho lindo ver os meus filhos aprendendo a seguir de mãos dadas, em compassos completamente descompassados.
Texto: Viviane Possato
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